Painel Eixo 1 – Direito à comunicação

Falas iniciais de provocação do debate

Nelsy Lizarazo – Associação Latinoamericana de Educação Radiofônica (Aler) – Colômbia/Equador

Gostaria de falar sobre algumas experiências de lutas por novos marcos normativos de comunicação e suas conseqüentes políticas públicas de comunicação na Argentina e no Equador. São experiências que a Aler tem acompanhado com suas associadas.

Os processos de luta para incidir em novos marcos de comunicação tiveram como primeira conseqüência positiva colocar em debate público o meio público da comunicação como direito – o que não é óbvio para todos, embora o seja para nós.

Em segundo lugar, a grande bandeira e luta fundamental tem sido a redistribuição das freqüências radioelétricas e a divisão equitativa do espectro. Assim se está afetando a estrutura da propriedade e se está tocando na questão do poder. Como os proprietários de meios são proprietários de outras empresas, o novo marco tem que afetar essa propriedade. É algo que tem conseqüência na construção de sentidos e discursos, tem direta relação com a pluralização de vozes e a diversidade de discursos. Tem que se pensar as possibilidades de fundo para financiar a produção local.

Gostaria de destacar também as diferenças entre o processo argentino e os demais latinoamericanos. Na Argentina, os setores comunitários e a sociedade civil se apropriaram da bandeira, não só os comunicadores.

Por fim, acredito que a comunicação pode ser um grande catalisador dos processos de integração da região latinoamericana.

 

Magali Ricciardi – jornalista – Argentina

A sociedade civil participou muito ativamente da experiência por um novo marco regulatório na Argentina. Em 2008, houve um conflito muito forte entre o governo nacional e os produtores agrícolas voltados à exportação (especialmente da soja). A partir disso, o jornal Clarín, pertencente ao maior grupo de comunicação do país, começou uma campanha forte contra o governo. O grupo Clarin é um grupo econômico que usa o poder da comunicação para fazer o que quer e desenvolver seu poder econômico que é bem maior que só comunicação.

Assim, as pessoas tomaram consciência de que havia essa campanha e começaram a se organizar para transformar a realidade. O processo envolveu a consulta de especialistas até a defesa de uma plataforma com 21 pontos para a nova lei geral de comunicação.

O grupo Clarín buscou medidas legais para não permitir as mudanças na regulamentação do setor. Mas houve um impulso e o povo teve muita força para se organizar e se capacitar para colocar no ar seus programas.

 

João Brant – Intervozes/ FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação) – Brasil

Neste debate, é importante partir de uma discussão conceitual sobre o direito à comunicação. Esse direito deriva da liberdade de expressão e o direito ao acesso à informação. O primeiro conceito de liberdade nasceu como conceito negativo, ou seja, o Estado não deveria impedir o cidadão de se expressar. Mas hoje existe o que podemos chamar de liberdade “premium”: aquela de quem pode falar para milhares de pessoas, ou seja, os donos dos meios de comunicação. E aí é preciso discutir a questão da igualdade nesse direito de liberdade de expressão. Não adianta produzir comunicação se não se pode fazer circular.

O que implica na prática a concepção de “direito à comunicação”? Implica a forma como a sociedade se organiza na prática pra fazer valer esse direito. Esse é um debate que precede o surgimento da internet. Enquanto houver impedimentos à realização do direito à comunicação, o Estado tem que agir para garanti-lo.

Quais violações ao direito à comunicação assistimos todos os dias? Vemos grupos sociais majoritários não fazendo valer sua voz. Rádios comunitárias sendo confinadas a uma parcela mínima do espectro. A produção centrada no eixo Rio-SP, com um Brasil sem o direito de se conhecer. Uma internet cara e de má qualidade.

É importante entender que o Estado é o principal garantidor e também violador do direito à comunicação. É preciso fazer esse debate sem medo de enfrentá-lo. Tem grupos enfrentando o problemas com muitas perspectivas diferentes. Também na internet a disputa tem sido feita.

No Brasil, é preciso que o processo de implementação das resoluções da I Conferência Nacional de Comunicação seja disparado. O movimento luta agora para obter um novo marco regulatório e o FNDC lançará em breve uma campanha nacional pela liberdade de expressão para todos como parte dessa batalha.

 

Ylmaz Orkan – Povo Curdo

Depois do golpe militar da Turquia, os curdos passaram a entender melhor a questão do direito à comunicação. Começaram a utilizar os veículos para falar de suas causas.

O acesso à internet pelo povo curdo é proibido na Turquia, pois o governo não quer que se saiba o que acontece. Um exemplo é o que aconteceu com o Jornal “Livre e Atual”: 66 jornalistas foram assassinados e o diretor do jornal condenado a mais de 100 anos de prisão.

Os curdos acreditavam que na Europa poderiam ter mais liberdade. Abriram então uma TV na Dinamarca, que foi depois fechada por meio de uma reivindicação da Turquia junto às instâncias da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Em dezembro do ano passado (2011), o governo bombardeou o povo curdo e a TV mostrou. Assim, houve nova repressão do governo contra os jornalistas curdos.

Depois da publicação de um artigo seu pela mídia alternativa no Brasil, recebe muitas perguntas de brasileiros querendo entender e se informar sobre o que se passa com o povo curdo. Pede a solidariedade internacional dos brasileiros.

 

Debate no plenário

 

Mercedes Lima – Coletivo de Mulheres Ana Montenegro – Brasil

Reforçar a importância do espaço radioelético ser considerado um bem comum. Nossa Constituição Federal já diz que ele é um bem do povo.

 

Victor Zacharias – Ciranda Internacional da Comunicação Compartilhada e Frentex (Frente Paulista pelo Direito à Comunicação e Liberdade de Expressão) – Brasil

Apresentou a campanha “Regula, Dilma!”, que está sendo feita nas redes sociais no Brasil, e que surgiu como estratégia de aproximar a ideia da campanha “Veta, Dilma!”, feita em torno do novo Código Florestal brasileiro, da agenda da comunicação. Nesse caso, não vai haver apoio da mídia, como houve quando o debate era sobre o meio ambiente. Mas convida todos a se somarem.

 

Rafael Lage – artesão – Brasil

Não tem segundo grau e é visto pela sociedade como “hippie”. Defende a necessidade de se fazer um debate sobre a invisibilidade de diversos setores e do preconceito inserido em cada um. Dedica sua vida ao registro da comunicação. Sofreu repressão da polícia e quer saber do direito que se tem de estar documentando a polícia. Gostaria de falar do capital social. Defende hackear a mídia convencional para mobilizar a massa, pois a internet ainda é um canal limitado. Fazer dessa repressão às rádios comunitárias, que está acontecendo no mesmo final de semana do FMML, o nosso “Pinheirinho” da comunicação.

 

Soraya Mislleh – Movimento Palestina para Todos – Brasil

Falou sobre a intervenção do companheiro do Curdistão. É de origem palestina e tem sofrido com piadas que tem a ver com os preconceitos veiculados pela mídia, que trata todos os palestinos como terroristas. Luta para romper com essa lógica e para ampliar o espectro, abrindo uma trincheira de luta para esses povos que sofrem com a repressão.

 

Ivan Moraes – Centro de Cultura Luiz Freira – Pernambuco/Brasil

Acredita que este é o momento de a sociedade brasileira, após a I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), se organizar de novo em torno da luta pelo direito à comunicação. Há muita coisa que aconteceu na Argentina e nós desconhecemos. O povo foi pra rua, não foi a Presidenta Cristina Kirchner que fez a mudança. No Brasil, a campanha que será lançada pelo FNDC é para que todo mundo possa se expressar livremente. Não podemos debater sobre isso somente nos seminários do movimento de comunicação. Foi difícil realizar a I Confecom e a gente conseguiu. Muito já foi esmiuçado, agora é hora de pôr o “pé na porta”. A indignação já existe e já se transformou em propostas; só é preciso que a gente se junte e que capilarize este debate.

 

Ativista que trabalha com a defesa dos direitos das crianças adolescentes – Brasil

Não existe grupo social que sofra maior corte ao seu direito à comunicação que as crianças e adolescentes. Percebeu que os adolescentes com quem trabalha tem muita idéia sobre uma mídia de qualidade. Durante a Conferência da Criança e do Adolescente, fizeram a cobertura do evento. Temos que chegar nesses meninos e inserir gente nova, com mais oxigênio, neste debate.

 

Renata Mielli – Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé/FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação) – Brasil

Temos que olhar pro exemplo da Argentina e ver que a luta não termina quando se alcança uma nova lei. E nós, no Brasil, estamos numa etapa anterior. O que nós temos construído para deslocar a correlação de forças é a ampliação do número de atores políticos nessa luta. A campanha que vamos lançar sobre liberdade de expressão no Brasil é uma das mais desafiadoras, pois os adversários são os que possuem os meios de comunicação. Estamos em busca de uma identidade visual a altura do desafio da campanha. Nos colocamos o desafio de estar com isso pronto até 27 de agosto, aniversário de 50 anos do Código Brasileiro de Telecomunicações.

 

Representante da Rádio Comunitária da Maré, no Rio de Janeiro/Brasil

Não existe palavra no Google capaz de expressar a alegria que sinto de estar aqui. O espaço radioelétrico é um bem infinito. Mesmo assim, nosso país se abstém de assumir um modelo que universalize o acesso a ele. Temos que usar as novas tecnologias da informação pra isso. A Lei 9.612/98, que regula a radiodifusão comunitária, foi criada na verdade para reprimir essas emissoras. A questão tecnologia digital será um tiro no pé das rádios comunitárias, pois o equipamento é muito caro. Temos que utilizar a internet.

 

Bia Barbosa – Intervozes – Brasil

É importante fazermos um diálogo entre as lutas que acontecem no Brasil com o debate internacional. O II FMML nasceu inclusive com o objetivo de articular internacionalmente essa grande luta em torno do direito à comunicação. Veio de uma decisão tomada em Dakar (Senegal), durante o Fórum Social Mundial de 2011. Embora não tenhamos massacres de jornalistas no Brasil, como no Curdistão, o problema é o mesmo em todo o mundo: são atentados diários à liberdade de expressão. São temporalidades e conjunturas diferentes, mas o mesmo problema. Temos que avançar na nossa articulação, fazer o levantamento de que países estão presentes no FMML e aproveitar este espaço para construir propostas concretas e conjuntas para além do Brasil.

This entry was posted in Memoria do Fórum. Bookmark the permalink.

Deixar uma Resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

*

Pode usar estas tags HTML e atributos: <a href="" title=""> <abbr title=""> <acronym title=""> <b> <blockquote cite=""> <cite> <code> <del datetime=""> <em> <i> <q cite=""> <strike> <strong>

Spam protection by WP Captcha-Free